Há quem tome o pequeno-almoço pouco tempo após o despertador tocar, outras pessoas preferem comer um par de horas depois e até há quem opte por fazer jejum até à hora de almoço. Mas existe uma hora ideal para tomar o pequeno-almoço?
Rita Giro, nutricionista e doutoranda em Nutrição Clínica na Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP), e Mónica Sousa, nutricionista, professora na Universidade Lusófona e investigadora no CINTESIS – RISE, respondem à questão e esclarecem algumas dúvidas sobre o papel do pequeno-almoço numa dieta saudável e equilibrada.
Segundo as duas nutricionistas, esta é uma questão mais complexa do que parece. “Não se pode dizer que existe uma hora particular” para tomar o pequeno-almoço “que seja mais benéfica para todos”, começa por assegurar Rita Giro.
Atualmente, há apenas um consenso no que toca à definição de pequeno-almoço. Esta é “a primeira refeição do dia feita até duas horas depois de acordar”, clarifica a especialista.
Mónica Sousa acrescenta que, de acordo com a evidência disponível, para ser considerado ‘pequeno-almoço’, esta refeição deve ser feita, no máximo, até às dez da manhã”.
Então, como saber qual a hora ideal para fazer a primeira refeição do dia? Rita Giro explica que existe alguma evidência que permite recomendar, de uma forma muito geral, a toma do pequeno-almoço mais cedo.
No entanto, assinala, “estamos a falar de uma variação muito individual dentro do intervalo entre as cinco e as dez da manhã”.
A nutricionista aponta que “talvez o ideal seja fazer o pequeno-almoço entre as sete e as nove”. Mas porquê? Porque, começa por explicar, “os nossos níveis de melatonina aumentam quando a luz reduz à noite e voltam a reduzir quando começamos a ter luz de manhã”.
Por isso, se uma pessoa acordar muito cedo – quando ainda é de noite – “e comer imediatamente pode estar a mimetizar, em termos metabólicos, o que acontece com uma pessoa que acorda durante a noite de propósito para ir comer”. Isso, na perspetiva da doutoranda na FCNAUP, “pode ser contraproducente”.
E se a pessoa optar por saltar o pequeno-almoço?
Mónica Sousa avisa que, “de uma forma geral, tomar o pequeno-almoço é um indicador de estilo de vida e comportamento geral de promoção da saúde”.
Em estudos observacionais (estudos, normalmente, com muitos participantes, que podem ser até de longa duração), “há uma tendência de associação positiva entre não tomar pequeno-almoço e o risco de aumento de peso e obesidade”, garante.
No entanto, os objetos de estudo em alimentação, particularmente “a obesidade e o aumento de peso, são multifatoriais”. O que acontece, muitas vezes, nos estudos observacionais é que se “olha para apenas um determinante, tornando a investigação redutora”.
Contrariamente, “nos estudos de intervenção, tipo de estudos que permitem perceber com mais clareza ‘causa-efeito’, não há este desfecho”. Contudo, este tipo de trabalhos “tem algumas limitações, nomeadamente grupos amostrais muito pequenos”.
O jejum intermitente tem sido usado como estratégia para a perda de peso, mas, segundo a nutricionista, “parece que um jejum intermitente cumpre melhor o ritmo circadiano se houver uma ingestão maior durante o dia e uma menor ingestão à noite”, aponta Sousa.
Assim, acaba por ser mais benéfico, em termos de perda de peso, usar essa técnica à noite do que propriamente abdicar do pequeno-almoço.
Apesar de tudo, contrapõe Rita Giro, tem de se ter em conta a questão dos hábitos. Por um lado, salienta, “o almoço e o jantar são refeições mais determinadas pela cultura, ou seja, é mais fácil alterarmos a hora destas refeições sem sentirmos grandes mudanças”.
Já o pequeno-almoço “é a refeição mais determinada geneticamente e pela nossa própria hereditariedade”. Por isso é que, por exemplo, se uma pessoa já tem uma rotina mais tardia e vai-se deitar mais tarde, não se deve forçar a pessoa a tomar o pequeno-almoço muito cedo, ou sequer a fazer essa refeição.
“Há muito esta ideia de que o pequeno-almoço é a refeição mais importante do dia, que é indispensável”, pondera a nutricionista. Mas não é bem assim. “Nem sempre é necessária. Tem de se perceber o contexto da pessoa, os seus horários, o seu ritmo de vida, as suas rotinas”, sustenta.
Forçar esta refeição pode ser prejudicial até “numa perspetiva de perda de peso”. Se a pessoa for fazer as restantes refeições do dia como antes, “vamos estar a adicionar calorias e alimentos”, conclui.
Na visão da especialista da FCNAUP, ter um pequeno-almoço saudável e equilibrado é mais importante do que seguir um horário.
“Acordar às sete e ter a possibilidade de tomar um pequeno-almoço completo em casa é mais importante do que estar preocupada em comer umas horas mais tarde e acabar por comer alguma coisa rápida no carro, só para desenrascar”, argumenta.
Assim, ter uma refeição rica e completa vai “regular muito melhor o apetite para as refeições seguintes do que se eu tivesse comido apenas uma banana ou um pão no timing ideal”. Se assim fosse “chegaria ao meio-dia com muita fome na mesma”.
Portanto, segundo Rita Giro, “mais importante do que o timing, é a composição da refeição”. Dessa forma consegue-se controlar melhor as refeições seguintes e a quantidade do que se vai consumir nessas refeições”.
O que compõe uma boa primeira refeição do dia? Mónica Sousa realça que “esta refeição tem algumas características específicas. Alguns autores dizem que a refeição deve ter pelo menos 20 minutos de duração e a energia ingerida deve conter entre 15 a 25% do valor energético total do dia”.
Além disso, “deve cumprir pelo menos 10% da maior quantidade possível de nutrientes face às recomendações” para cada pessoa individualmente. Os considerados ‘nutrientes de foco’, como o cálcio, o potássio e a fibra, devem estar em pelo menos 20%” dos alimentos ingeridos.
Por esse motivo, acrescenta, o pequeno-almoço “deve ter alimentos dos grupos alimentares ricos em fibra, do grupo dos lacticínios e deve ter um elemento de fruta e/ou vegetais”.
O Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável (PNPAS) recomenda “a introdução de um laticínio – leite, iogurte ou queijo – cereais e derivados – de preferência de gamas mais integrais, com elevado teor em fibra – e também uma fruta”, cita a investigadora.
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